quarta-feira, maio 18, 2005

Júlio Dantas --- Poeta algarvio



O Incêndio

- "Ao convento! ao convento!" - Uiva de longe o vento.
É noite. E a multidão, descalça, esfomeada,
à luz de archotes, sobe a ladeira empedrada,
praguejando e gritando: - "Ao convento! ao convento!"

A onda do povo cresce e galga num momento.
Chispam ferros no ar. A porta, chapeada
de bronze, range, oscila e cai à machadada.
Nem um frade. Deserta a casa de S. Bento.

A multidão convulsa invade a portaria:
- "Fogo ao convento! fogo à igreja, à sacristia!"
O incêndio lavra, estoira o vigamento a arder.

Em baixo, o povo dança. E uma mulher grosseira
grita, rouca, atirando um Missal à fogueira:
- "Tanto livro, e ninguém nos ensinou a ler!"


Júlio Dantas

A Poesia Eterna, por Marco Dias .

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